Há alguns anos em meu curso de línguas, entediada com as temáticas pouco criativas das redações, perguntei a minha teacher se poderia iniciar um romance para os deveres de redação, e assim surgiu essa estória. Nos últimos meses ela tem me perseguido a procura de papel para morar e enfim, ainda que meu coração anseie por estórias mais profundas, não suportei mais e tive que reescreve-la. Tentei reestrutura-la fora dos contos de cavalaria, mas ela já havia nascido e não tinha como negar seu berço. Enfim criei coragem para posta-la aqui com um agradecimento especial a minha amiga Déborah que tem me impulsionado a continuá-la: é a você – Déborah – que dedico esse romance infanto-juvenil (como tu, minha melhor e quase única crítica, a classificaste) prometo que em breve continuarei os capítulos...
Coração de Valentin- Parte I
Cada pessoa é única e isso faz dos homens mais humanos ou mais rudes por uma simples diferenciação da natureza. Nunca existira um homem que pense como outro, não importa quanto possam gostar das mesmas coisas, terem vivido as mesmas experiências ou tenham nascido juntos, nem que séculos ou milênios passem. Jamais voltará a existir uma alma que já viveu. Essa é uma verdade simples que torna cada vida especial, e que não provoca sentimento algum à humanidade. Mas para nós, o povo da torre Azul, é uma verdade triste que só significa uma única dor: jamais renascerá um homem como Valentin...
As palavras faltam-me, quando me perguntam sobre ele, numa mistura de orgulho por tê-lo visto crescer e de dor por saber que jamais o verei novamente. Estou velho e o tempo me é curto. Que a rainha da vida me permita forças para completar esse relato, das coisas que vi e que não desejo que se percam com a minha morte. Que minhas lágrimas evaporem antes de tocar o papel em que escrevo e que o senhor meu rei, e meu sempre amigo, providencie um bom lar para essa história. Que ela seja lida por todos e ninguém jamais esqueça de um grande coração. E que ao coração de quem lê essa história fale, não as minhas palavras, mas sim da bondade de Valentin. Por que quem escreve é apenas um velho guerreiro que há muito admira os grandes domadores das palavras, mas que está muito velho para aprender este ofício, por isso, peço perdão pela ousadia. Só o faço por que acredito que esta história mereça estar nas estantes de cada reino para que as pessoas, ao lê-la compreendam o Valentim de dentro de seus corações e o deixem sair.
Eu sou Serafim, e por muitos anos servi ao rei deste reino com lealdade, não por juramento, mas por admiração e amizade. Nossa majestade, o rei Bonifácio, juntamente com nossa amada rainha Lia, sempre governou com justiça e sabedoria. E não houve noite que, após os últimos treinos, a caminho de meu quarto eu não os encontrasse conversando sobre os problemas do reino, sentados sobre o luar que atravessava a janela da biblioteca. Não havia decisão alguma que o rei tomasse sem consultar a rainha e não havia coisa alguma que a rainha soubesse que não chegasse ao conhecimento do rei.
Minha função como primeiro guerreiro consistia em treinar aqueles que desejassem serem guerreiros nas artes das armas e do conhecimento, contudo, nunca houve uma batalha entre outro reino em meu tempo. Havia um jovem em que eu admirava como filho e a ele dediquei mais atenção. Permanecíamos sempre após os treinos discutindo lógica e filosofia, ao meu estimado Justo eu ensinava tudo que sabia e podia, na esperança de que ele um dia substituísse meus ossos gastos.
A rainha amava as artes e, principalmente para agradá-la, o rei mantinha uma vasta biblioteca no castelo. Sempre que tinha chance eu procurava ler alguns deles, e era lá que passava os meus melhores momentos, quase todos os dias. Numa manhã deparei-me com Rosa, a mais linda flor do reino, sobre a luz da aurora, lendo um livro de poemas e me apaixonei por ela. Por muitas vezes nos encontramos sobre o despertar do dia para nos aventurarmos entre os livros, como ela costumava brincar. Até que finalmente declarei-me a ela e pedi sua mão. E aos fins de tarde encontrava-me com nossos governantes para fala-lhes sobre meus aprendizes. Era um grande prazer para mim ir vê-los e permanecer ao seu lado. Ao escurecer a rainha retirava-se, e o rei e eu permanecíamos a conversar noite adentro, eu era para ele um igual e sentia muita alegria pela sua amizade.
Essa foi minha rotina por anos até aquela primeira tarde em que encontrei somente o rei, muito nervoso, olhando pela janela. Era uma sala ampla e me pareceu terrivelmente angustiante ver o rei só e abatido, até os livros me pareceram sóbrios demais enfileirados em suas prateleiras. Aproximei-me respeitosamente e ele olhou-me angustiado:
- minha rainha... ela teve um desmaio esta tarde. Ana disse-me que ela tem passado mal há dias, estou preocupado Serafim...
Eu, que nunca dominei as palavras de conforto, permaneci calado e me aproximei, preocupado. O rei precisava exteriorizar seus temores e esperei que falasse:
- O curador está no quarto com ela desde o desmaio e as damas não me deixam entrar e não me dizem como ela está... acha que pode ser grave? Se acontecer algo com ela....
- Tenha calma meu senhor... um desmaio pode significar muitas coisas, e nossa rainha sempre foi muito forte. Há de ser apenas cansaço, alguma outra coisa que pode ser curada com repousos.
Neste momento uma das damas, Sara entrou e com um sorriso nos lábios, não pode conter sua língua:
- Que Deus permita que ela não seja curada, meu senhor.
A rainha vinha atrás dela e riu de sua observação, aproximou-se do rei, que encarava Sara, e sussurro algo em seu ouvido. A expressão dele suavizou-se e ele riu, a ergueu e a rodopiou e subitamente parou, colocando-a no chão com cuidado com medo que a tivesse machucado, mas ela simplesmente voltou a sorrir:
- Está tudo bem, meu querido, eu não estou doente.
E virando-se para mim que era o único presente que olhava confuso para as damas que chegavam e riam baixinho falou:
- Serafim, por favor, permita com que esta fofoca, que minhas damas certamente espalharão pelo castelo, com grande alvoroço, chegue a todo o reino. Dentro de oito meses o reino ganhará um príncipe.
As damas não contiveram seus risos ao me verem estático em frente à rainha, sem saber o que dizer, foi minha doce Rosa que guiou-me sussurrando ao meu ouvido:
- você pode sorrir se quiser e agora se despeça e deixemos os jovens pais a sós....
E foi o que fiz, a alegria deles era minha também e já me via ensinando os movimentos da espada a um pequeno garoto de cabelos escuros.
Os dias nunca mais seriam os mesmos. Na primeira semana as damas se mantiveram muito ocupadas em contar e recontar o quanto o rei e a rainha sorriam e como ele não a deixava por mais de minutos. Mas nem por isso o reino deixou de ser governado e administrado, apesar de magicamente as discussões que necessitavam da interferência do rei diminuíssem. E o que mais se falava nos corredores do castelo era com quem o bebê se pareceria.
Eu ainda ia à biblioteca, aos fins de tarde, para conversar com o rei e a rainha, mas agora, quando ela se recolhia ele a acompanhava e eu passei a adquirir o habito de ler algumas páginas de alguns livros antes de recolher-me. Na maioria das vezes não os retomava e a cada dia iniciava uma nova leitura até que Rosa pediu-me autorização, como se precisasse, para acompanhar-me e passamos a fazer leituras conjuntas. Aprendemos muito naqueles meses, e muito do que li deu-me forças para a pior noite de nossas vidas. Que a cada dia se aproximava sorrateira, como uma alma invejosa arrastando-se por entre as sombras da felicidade a espera de uma oportunidade para destruí-la.
Rosa e eu estávamos cada dia mais apaixonados e a cada dia nossa angustia era maior ao nos separarmos para nossos quartos e aguardávamos com tanta ansiedade quanto aos reis o nascimento do herdeiro para finalmente nos unimos perante Deus e os homens. Por algum motivo jovial que me escapa a memória, decidimos esperar o nascimento na intenção de fortalecermos ainda mais nossa vontade, espera essa, acreditávamos, que nos proporcionaria maior felicidade quando finalmente o dia chegasse.
Nossa rainha apreciava muito a companhia de Rosa e lembro-me de uma noite em que ela nos interrogou sobre nosso amor, diante do rei, olhando em meus olhos:
- meu senhor, o que tanto pedes ao primeiro guerreiro que a ele não sobra tempo para selar, enfim, seu amor pela minha melhor amiga?
- posso dar a ele o tempo que pedir, para algo tão esplendido.
Ao que eu, diante da reposta do rei corei, e foi minha querida Rosa que em meu socorro desculpou-se com um pequeno riso nervoso:
- vossas majestades são muito gentis, mas tenho que confessar que a culpa também é minha, por querer uma data que está tão longe.
- E por que desejas esperar tanto, se o que uma mulher mais deseja é carregar o nome daquele que possui seu coração?
- A data me é muito cara, minha senhora.
- Se a considera tão importante não tenho o direito de intervir, mas sinto a obrigação de lembrar que nenhuma data pode ser mais importante que o sentimento. E não é sempre que a espera trás alegria.
- mas as nossas com certeza trarão, minha querida. E permita-me oferecer uma grande festa para comemorarmos juntos, o amor de nossos mais estimados amigos e o nascimento de nosso já amado filho.
Disse o rei feliz, acariciando o ventre da esposa que em quatro meses crescera bastante, ao que todos diziam que o amor de ambos e de todo o reino para com a futura criança o fazia crescer como uma planta bem cuidada. Quanto a mim, vi-me mais vermelho do que nunca:
- é uma grande honra, meu senhor...
- não permitirei recusas – disse o rei, tocando meu ombro e olhando-me nos olhos – vocês serão os padrinhos de nosso filho, eu não o confiaria a mais ninguém.
E a nos só restou agradecer com lágrimas nos olhos, emocionados e felizes.
No último mês de gravidez Rosa me confidenciou que uma sombra parecia pairar sobre o semblante da rainha. Logo ficou evidente a todo o reino que algo a preocupava demasiadamente, todos o atribuímos ao nervosismo e ansiedade e o rei passou a cercá-la ainda mais de cuidados e delicadezas. Até chegar o dia em que soubemos o horror inominável que aproximava e a rainha não tinha coragem de confidenciar a ninguém.
O rei acordou assustado dizendo que a rainha sentia dor, o curador foi chamado, mas não encontrado, Ana o tranqüilizou dizendo que era normal e que até o fim do dia a criança nasceria. Naquele dia o reino parou, como se nem mesmo uma folha tivesse despencado de alguma Árvore. Só recordo-me que ao fim da tarde uma pequena chuva se anunciou. Já era noite, e apesar da chuva não ser violenta alguns trovões e raios apresentaram-se aumentando o angustia do rei, que desde o inicio da tarde andava de um lado a outro em frente ao corredor de aceso ao quarto, único lugar que nos permitiram ficar, com os nervos cada vez mais danificados a cada movimento de Ana, Rosa e Sara. Quando uma delas entrava ou saia do quarto, ele parecia mais angustiado. Ao ponto que Rosa pediu que todos se retirassem, para deixar o rei mais a vontade e trouxe uma taça de vinho, que tive de insistir para que tomasse.
- não quero alterar meus sentidos...
- meu senhor, seus sentidos já estão alterados há muito tempo, isso o ajudará a controlá-los.
Finalmente, após seu segundo gole, ouvimos o choro insistente do recém nascido e o rei correu para o quarto, derrubando a taça, e ouvi sua voz, num misto de angustia a fúria, no corredor:
- o que está dizendo?!
Quando me aproximei, com o coração aos saltos, Rosa estava posta no meio do corredor de braços abertos e falava quase num sussurro.
- por favor senhor, tem de aguardar mais um pouco...
- por quê? O que está acontecendo?
Foram alguns minutos intermináveis, em que o silêncio pareceu tomar conta do mundo e podíamos ouvir nossas respirações, até que o choro recomeçou e Rosa, com angustia nos olhos, olhou de mim para o rei até conseguir balbuciar:
- meu se... senhor... eu...
Então ouvimos um segundo choro de bebê, os olhos do rei ficaram graves e Ana saiu do quarto, o rei virou as contas para as damas, mas eu pude ver sua expressão quando ela anunciou:
- são dois lindos bebes, meu rei
Foi como se sua face perdesse a vida e me senti vendo um morto falar, olhando para o vazio:
- Serafim. Mate-o.
O sangue de nós três congelou e nos vimos cada qual mais pálido que o outro. Rosa falava com se não fosse capaz de pensar:
- senhor, meu rei... são...
- leve o segundo, não me obrigue a fazê-lo por minhas próprias mãos. MATE!
Seu grito tirou a todos do transe, sabíamos que o rei, apesar dele nunca ter cometido maldade alguma, estava decidido a aquela crueldade terrível. Por segundos minha cabeça girou e, incapaz de pensar, avancei em direção ao quarto sem sentir meus passos, não vi Ana postar-se a minha frente antes de eu empurra-la, não olhei para os olhos assustados da rainha e de Sara que ouviram o grito do rei e desviei o olhar do segundo bebê que estava em seus braços. No berço, ao seu lado, repousava o primogênito e foi este que agarrei com todo o cuidado e o carreguei do quarto, o mais rápido que pude, desviando dos olhos suplicantes de Rosa, de seus gritos a me chamar e da rainha a clamar por outro nome. A única vez que chamaria seu bebê pelo nome. O rei não ousou olhar para nós, dirigi-me a coxia ainda acompanhado dos gritos que ecoavam em minha mente: de Rosa, da rainha e do choro do outro bebê. O que eu tinha em meus braços parecia aninhar-se, tranqüilo e em paz.. Tudo parecia um terrível pesadelo e eu corria como um animal sem cabeça.
Enrolei o bebê cuidadosamente para protegê-lo da chuva e seus olhos fixaram-se nos meus e ele dormiu, segundos depois que meu cavalo disparou conosco, sem temor algum. Em minha cabeça só rodopiava uma certeza, a de que se ele ficasse aquela noite no castelo, não amanheceria, precisava levá-lo para longe, até as coisas acalmarem-se. O rei voltaria ao seu espírito e o procuraria, então voltaríamos e todos esqueceriam da terrível maldição. E acalentado por este pensamento, foi que sai cavalgando no meio da escura chuva, com o pequeno em meus braços e eu curvado sobre ele para que minha capa o protegesse da tempestade. A medida que me afastava do castelo os relâmpagos diminuíam, a chuva afinava, mas meus pensamentos continuavam num turbilhão. Contudo, cada vez que eu olhava para o menino e o via dormir quentinho e tranqüilo sentia, confortado, que ele confiava em mim e meus pensamentos iam clareando.
O temor da maldição perdera-se na lembrança, mas voltaria com toda a força quando o reino soubesse da existência dos dois meninos, assim como tomou conta do rei. Então arquitetei um plano, faria com que todos pensassem que ele morreu e quando o reino estivesse tomado pelo luto voltaríamos, e todos festejariam e se esqueceriam da maldição.
Na floresta, encontrei uma cabana de caça aconchegante e pus o bebe sobre uma cama de palhas secas e macias, rasguei minhas vestes, enrolei alguns pedaços nos arreios do cavalo, tirei a montaria e o espantei. Ele saberia retornar ao castelo e quando todos a vissem imaginariam o pior. O bebe abriu os olhos quando me aproximei e deitei ao seu lado para melhor aquece-lo. Sua mão estava quente e ele voltou a dormir.
Na manhã seguinte acordei com uma criança de sete anos em minha frente gritando:
- PAI!!!
Um homem de meia idade apareceu na porta da cabana e olhou-me surpreso.
- o senhor deve morar aqui, peço desculpas pela invasão, ontem chovia...
- não diga mais nada. Esta cabana pertence a todos...
Nisto o pequeno interrompeu-nos e começou a chorar. O garoto se aproximou:
- ele está com fome.
- meu Deus, preciso alimentá-lo.
- Então venha comigo e eu os levarei a aldeia.
Durante longas duas horas em que a carroça sacolejava na pequena estradinha e o bebe chorava agora a plenos pulmões, o homem não perguntou quem eu era ou de onde viemos. Era um homem simples que não precisava de explicações, disse apenas seu nome, Olívio, e falou de suas funções de marceneiro.
Quando nos aproximamos de sua aldeia as mulheres ouviram o choro e correram em nossa direção, logo ele era alimentado por elas e quando perguntaram seu nome lembrei dos gritos da rainha:
- Valentim...
Devo ter denunciado meu estado de espírito porque não me perguntaram mais nada e me ofereceram comida. Olívio disse que se eu estivesse disposto a ajudá-lo poderia ficar com eles e que a esposa ajudaria a cuidar do bebe. Eu nunca ficara muito tempo longe do castelo e ninguém me reconheceu, comovido pela generosidade daquelas pessoas decidi revelar o que podia. Disse que não era pai do menino, mas amigo de seus pais e que tentava salva-lo. Minhas roupas rasgadas às fizeram imaginar o resto e por uma semana ajudei Olívio e se família no que podia, dormia com eles e sua esposa cuidava de Valentim a maior parte do tempo, mas considerei que era injusto aumentar suas obrigações e a pedi para ensinar-me a cuidar dele, explicando que se eu era responsável por ele era minha obrigação cuidar dele, ela passou a me ensinar, mas não saia de perto de nós.
A aldeia ficava muito longe do castelo e só tinha-se notícias do reino no fim da semana quando alguns iam vender ou comprar. Ao quarto dia um aldeão retornou com as notícias: o herdeiro havia nascido, era um lindo menino, mas o reino não comemorava, estava de luto pela morte do primeiro cavaleiro, que saira no temporal a procura do curador e não retornara. O aldeão contou em detalhes como a rainha tivera um parto difícil e como o cavalo do guerreiro voltara, mas não mencionou uma palavra sobre o segundo bebê e eu finalmente aceitei o que não desejava acreditar. Ninguém mencionara a existência de gêmeos e neste momento apenas quatro pessoas no reino acreditavam que um príncipe estava morto. Enquanto ele respondia as perguntas dos aldeões fiquei a me perguntar como pude ser tão estúpido a ponto de acreditar que o rei mencionaria Valentim. Portanto o problema se tornara maior, se retornássemos como explicaríamos a existência de um bebê que o rei não mencionara. Mas o coração jovem é ingênuo e está sempre cheio de entusiasmo e ilusão a boa vontade dos homens e minha imaginação estava fértil. E imaginei uma estória mirabolante com um ladrão de bebês e eu a procurá-lo sem o conhecimento do rei. Daria certo, só precisava falar com Rosa, ela me ajudaria. Não queria levantar suspeita e esperei até o próximo aldeão ir ao castelo e me ofereci a ajudá-lo com a desculpa de que precisava comprar tecidos e roupas para mim e o bebê. Nos separamos na feira e quando me dirigi ao castelo a vi em uma carruagem de viagem de cabeça baixa e mãos dadas com um jovem que nunca vira e ouvi a conversa de duas mulheres ao meu lado:
- é a noiva do primeiro guerreiro?!
- Era. Ouvi as damas da rainha dizerem que ela iria para o reino da terra vermelha com um conselheiro daquele reino, deve ser aquele lá.
Não derramei uma lágrima, mas meu coração se partiu, esperamos tanto para nos unirmos e agora esta felicidade nunca se realizaria, ela não esperara para partir com outro. Foi com olhos cegos que voltei a carroça do aldeão, cheguei a vila, entrei na casa de Olívio e só voltei a ver e ouvir quando meus olhos encontraram os de Valentin e ouvi seus resmungos. Não sabia o que fazer e meu único desejo era cuidar dele.
E assim vivemos...
Construí uma cabana ao lado da de Olívio e nas primeiras noites sua esposa relutava em nos deixar dizendo que o menino precisava de uma mãe, mesmo que fosse substituta. Até a manhã que nos acordou, disse que vira como dormíamos e que sentira que eu cuidaria bem dele. Mas de qualquer modo sempre estava nos levando algo. Margarida fez-se mãe de Valentin. Mas não foi a única, desde o inicio todas as mulheres da vila compadeceram-se por nós dois e à medida que o menino crescia encantava a todos e conquistava a amizade das crianças. Valentin também teve muitos irmãos.
E cresceu: forte, valente e generoso. Não me lembro de um única briga em sua infância, de nenhum gesto de egoísmo ou grosseria. No entanto metia-se em problemas com freqüência, junto com o filho mais novo de Olívio que nascera um ano mais tarde, Silvestre. Os dois tornaram-se inseparáveis e sua amizade e cumplicidade alcançara a juventude.
Posso contar nos dedos, e eles ainda sobram, as vezes que retornei ao castelo. Como era normal a aldeia saber sobre o que se passava com o reino sempre soube a distancia como o príncipe crescia; maroto e generoso. Justo fora nomeado o novo primeiro guerreiro alguns anos mais tarde e antes dele dois guerreiros foram desaprovados pelo rei que parecia ter ficado mais exigente e genioso. Corria o boato que nem mesmo a rainha apreciava mais sua companhia, passando o tempo com o filho. Outros diziam que devido a este excesso de mimo que o rei, enciumado, tornara-se amargurado. Mas a família real era amada pelo seu povo e passados os primeiros meses de mudanças o povo acostumou-se a nova rotina real e parou-se de se falar da vida pessoal dos soberanos, havia muitos nobres com motivos mais picantes para terem suas vidas comentadas a todo instante.
Continua, neste mesmo "bat-endereço", um dia desses...
por Adri.n
domingo, 30 de março de 2008
quarta-feira, 26 de março de 2008
Alguns sonhos merecem serem contados...
Quem me conhece sabe o quanto os sonhos fazem parte de minha vida. E bom mesmo é quando algum anjo criativo constrói estórias em meus sonhos. Este aqui me encantou tanto que quando acordei corri para registrá-lo antes de esquecer algum detalhe. Não senti o mesmo que quando sonhava, mas ainda assim é uma linda estória:
Um homem e um pássaro
Um homem, admirador de pássaros, passava as tardes a vê-los pendurados nos pequenos galhos de capim, beliscando suas sementes. E aproximava-se devagar, o mais silenciosamente que conseguia, para vê-los mais de perto. E quanto sentia que estes paravam de alimentar-se e erguiam suas cabecinhas, recuava para não atrapalha-los em sua refeição. Com o tempo os pássaros se acostumavam ao homem e seus corações não se agitavam mais quando o viam se aproximar.
Aconteceu que um dia ele tropeçou e quase caiu em frente aos pequenos, que voaram em alvoroço antes que ele terminasse de se desculpar: não tenham medo, me perdoem, por favor, não se vão. E então seus olhos deram com os olhos de uma dos pequenos que permanecia agarrado na longa folha que balançava cada vez mais com seu coração agitado. E os dois se apaixonaram.
De inicio a avezinha se aproximava e quase pousava em seu ombro quando chegava o homem, que não via mais nenhum pássaro além de sua doce amiga. Até que chegou o dia que o homem não foi ao capinzal e a ave, sem fome, voou e voou até avistá-lo dentro de uma janela coberto por estranhos panos. E a pobre se desesperou, imaginando que ele estivesse morto e pôs-se a bater-se contra o vidro tentando inutilmente entrar. O homem abriu os olhos e cambaleou até a janela, com esforço conseguiu abri-la e a pegou entre as mãos: o que está fazendo, minha pequena, podes se machucar. Ao que esta fechou os olhos lentamente e cantou: você não vi, agora vejo, está bem! E dormiram na mesma cama até o homem sarar.
E depois não se largaram mais, para onde o homem ia a ave o seguia voando baixo ou pousada em seu ombro e aos fim de tarde ficavam juntos, com ela acomodada em suas mãos quentes, a observar o pôr do sol. Os amigos achavam tudo um exagero, as mulheres encantador. O homem casou e com o tempo a mulher passou a ter ciúmes da ave, dizia que ele passava mais tempo com esta que com ela. E o homem, temendo alguma maldade da mulher, disse que se alguma coisa acontecesse à ave, ele se mataria. A mulher fugiu com outro e ele e o pássaro passaram a viver sozinhos. De vez em quando esta lhe trazia outro que estava ferido e o homem aprendeu a cuidar de pássaros como ninguém.
E foi por sua fama que um aprendiz o procurou para. Este nunca aprendeu a falar com as aves como o homem, mas compreendia o amor que existia entre ele e ave. Um dia o homem, já velho, foi encontrado morto sobre a grama do jardim. Ninguém notou o pequeno pássaro sem vida, ao lado de seu corpo, quando o levaram para o caixão. Mas o aprendiz pegou o pequeno corpo, ainda quente, de penas brancas e tão esfarrapadas que poderia se dizer que fora a ave mais velha do mundo, não soube precisar se o homem morrera ao encontrá-la sem vida ou se ela finalmente deixara a vida para acompanhá-lo. E quando ninguém via acomodou o pequeno corpo sobre o coração do homem, escondido entre as flores que decoraram sua última cama.
Por algum anjo contador de histórias em visita aos sonhos de Adri.n
Um homem e um pássaro
Um homem, admirador de pássaros, passava as tardes a vê-los pendurados nos pequenos galhos de capim, beliscando suas sementes. E aproximava-se devagar, o mais silenciosamente que conseguia, para vê-los mais de perto. E quanto sentia que estes paravam de alimentar-se e erguiam suas cabecinhas, recuava para não atrapalha-los em sua refeição. Com o tempo os pássaros se acostumavam ao homem e seus corações não se agitavam mais quando o viam se aproximar.
Aconteceu que um dia ele tropeçou e quase caiu em frente aos pequenos, que voaram em alvoroço antes que ele terminasse de se desculpar: não tenham medo, me perdoem, por favor, não se vão. E então seus olhos deram com os olhos de uma dos pequenos que permanecia agarrado na longa folha que balançava cada vez mais com seu coração agitado. E os dois se apaixonaram.
De inicio a avezinha se aproximava e quase pousava em seu ombro quando chegava o homem, que não via mais nenhum pássaro além de sua doce amiga. Até que chegou o dia que o homem não foi ao capinzal e a ave, sem fome, voou e voou até avistá-lo dentro de uma janela coberto por estranhos panos. E a pobre se desesperou, imaginando que ele estivesse morto e pôs-se a bater-se contra o vidro tentando inutilmente entrar. O homem abriu os olhos e cambaleou até a janela, com esforço conseguiu abri-la e a pegou entre as mãos: o que está fazendo, minha pequena, podes se machucar. Ao que esta fechou os olhos lentamente e cantou: você não vi, agora vejo, está bem! E dormiram na mesma cama até o homem sarar.
E depois não se largaram mais, para onde o homem ia a ave o seguia voando baixo ou pousada em seu ombro e aos fim de tarde ficavam juntos, com ela acomodada em suas mãos quentes, a observar o pôr do sol. Os amigos achavam tudo um exagero, as mulheres encantador. O homem casou e com o tempo a mulher passou a ter ciúmes da ave, dizia que ele passava mais tempo com esta que com ela. E o homem, temendo alguma maldade da mulher, disse que se alguma coisa acontecesse à ave, ele se mataria. A mulher fugiu com outro e ele e o pássaro passaram a viver sozinhos. De vez em quando esta lhe trazia outro que estava ferido e o homem aprendeu a cuidar de pássaros como ninguém.
E foi por sua fama que um aprendiz o procurou para. Este nunca aprendeu a falar com as aves como o homem, mas compreendia o amor que existia entre ele e ave. Um dia o homem, já velho, foi encontrado morto sobre a grama do jardim. Ninguém notou o pequeno pássaro sem vida, ao lado de seu corpo, quando o levaram para o caixão. Mas o aprendiz pegou o pequeno corpo, ainda quente, de penas brancas e tão esfarrapadas que poderia se dizer que fora a ave mais velha do mundo, não soube precisar se o homem morrera ao encontrá-la sem vida ou se ela finalmente deixara a vida para acompanhá-lo. E quando ninguém via acomodou o pequeno corpo sobre o coração do homem, escondido entre as flores que decoraram sua última cama.
Por algum anjo contador de histórias em visita aos sonhos de Adri.n
segunda-feira, 24 de março de 2008
Amirável mundo velho
Em meios às fendas da terra seca, distante das grandes construções de concreto e do movimento constante das máquinas e quando não havia luta por comida ou armas; crianças, jovens e adultos reuniam-se ao redor do velho que não podia morrer, para alimentarem a alma com suas história, de um mundo que se perdera para sempre. Do qual só restara ele, ferido e contaminado pelo vírus da imortalidade, guardião da história para o resto da eternidade no que restara do mundo.
Quando os que nunca se cansavam de ouvi-lo se reuniam ao seu redor, ele fechava os olhos e recordava o que era viver:
Do cheiro das manhãs de primavera, de folhas verdes e macias, saborosas de serem tocadas e, também, mastigadas e de como o verde se enchia de cor e formas de todos os tipos imagináveis, ou não, deixando o ar com um cheiro delicioso e encantador.
De seres minúsculos que se moviam ao seu redor, de todas as cores e formatos, e dos grandes seres também igualmente diferentes em cores e formas, alguns encantadores, outros assustadores, inofensivos ou perigosos, de muitas pernas ou com nenhuma. De como não se tinham maquinas para fazer tudo, mas se tinha de tudo enquanto agora só se tinha elas.
De como era simples matar a cede.
Das partículas brancas nascendo na copa das árvores das serras, subindo ao céu com grande velocidade até se encontrarem com massas gigantescas e brancas, tão concretas aos olhos, mas incapazes de serem tocas, que caiam do céu sem cor, matavam a sede e molhavam tudo ao seu redor. E do encontro destas com a grande estrela, que formava arcos multicores no céu.
E como era difícil fazer as crianças entender o que significava mergulhar. Elas ouviam fascinadas, de olho fechado ou decifrando os desenhos do velho, tentando imaginar como era sentir a grama em suas solas e palmas ou o sabor de uma fruta colhida do pé. Um mundo irreal, fantástico, contos mágicos que elas nunca viveriam.
O velho chorava por elas, mas principalmente chorava por não ter se perdido junto com o que fora destruído. Seu peito se abria a cada vez que recontava suas histórias, mas se não as fazia sentia lhe faltar o ar e ainda assim não morria.
Um dia comentou com um grupo delas que as crianças daquele tempo gostavam de historia sobre lugares como o mundo em que viviam: com maquina fantásticas e de todas as formas e tamanhos, e cidades cinzentas e de histórias de guerras. E que os adultos não davam importância à grama, aos pequenos seres, ao frescor... Por vezes a tudo ignoravam ou optavam por viver em grandes construções e ansiavam por criarem máquinas como as quais eles tinham agora.
E até o menor deles enfureceu-se com o velho, protestando que não precisavam de pena, de serem consolados por nascerem no tempo errado e que ninguém acreditaria em algo tão absurdo.
Quando os que nunca se cansavam de ouvi-lo se reuniam ao seu redor, ele fechava os olhos e recordava o que era viver:
Do cheiro das manhãs de primavera, de folhas verdes e macias, saborosas de serem tocadas e, também, mastigadas e de como o verde se enchia de cor e formas de todos os tipos imagináveis, ou não, deixando o ar com um cheiro delicioso e encantador.
De seres minúsculos que se moviam ao seu redor, de todas as cores e formatos, e dos grandes seres também igualmente diferentes em cores e formas, alguns encantadores, outros assustadores, inofensivos ou perigosos, de muitas pernas ou com nenhuma. De como não se tinham maquinas para fazer tudo, mas se tinha de tudo enquanto agora só se tinha elas.
De como era simples matar a cede.
Das partículas brancas nascendo na copa das árvores das serras, subindo ao céu com grande velocidade até se encontrarem com massas gigantescas e brancas, tão concretas aos olhos, mas incapazes de serem tocas, que caiam do céu sem cor, matavam a sede e molhavam tudo ao seu redor. E do encontro destas com a grande estrela, que formava arcos multicores no céu.
E como era difícil fazer as crianças entender o que significava mergulhar. Elas ouviam fascinadas, de olho fechado ou decifrando os desenhos do velho, tentando imaginar como era sentir a grama em suas solas e palmas ou o sabor de uma fruta colhida do pé. Um mundo irreal, fantástico, contos mágicos que elas nunca viveriam.
O velho chorava por elas, mas principalmente chorava por não ter se perdido junto com o que fora destruído. Seu peito se abria a cada vez que recontava suas histórias, mas se não as fazia sentia lhe faltar o ar e ainda assim não morria.
Um dia comentou com um grupo delas que as crianças daquele tempo gostavam de historia sobre lugares como o mundo em que viviam: com maquina fantásticas e de todas as formas e tamanhos, e cidades cinzentas e de histórias de guerras. E que os adultos não davam importância à grama, aos pequenos seres, ao frescor... Por vezes a tudo ignoravam ou optavam por viver em grandes construções e ansiavam por criarem máquinas como as quais eles tinham agora.
E até o menor deles enfureceu-se com o velho, protestando que não precisavam de pena, de serem consolados por nascerem no tempo errado e que ninguém acreditaria em algo tão absurdo.
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Acho que estou num período fértil de criação...
sexta-feira, 21 de março de 2008
Olhos de falcão
Por traz de pilhas de papéis, sentado em sua cadeira de couro, o falcão olhava para as grades da janela o pequeno pedaço do céu que se apresentava aos seus olhos. Ele nascera para voar na imensidão azul, o céu o pertencia. Mas ele não sabia disso. Fora criado atrás de grades entre pilhas de papéis e objetos de todos os tipos e tamanhos. Olhar o céu o angustiava, mas ele não sabia mais por que. Tentara trancar a janela, mas sua angustia aumentava quando não o via. Distraia-se olhando os que passavam. Um jovem de longos cabelos que andava a toda hora ou em hora nenhuma, invejava-o, mas não sabia:
- coisa radícula essa juba. – reclamava, sua simples visão o angustiava.
Havia a jovem sorridente que sempre estava com a casa cheia de amigos. Inveja-a, mas não entendia:
- bando de desocupados que não tem mais o que fazer. - surrava o falcão para as paredes.
O filho fora subir um penhasco invejava-o mais do que a todos, mas não reconhecia:
- esta procurando a morte, ou quer ficar em uma cadeira de rodas? – gritara para o filho quando este o deu as costas e partiu para a aventura.
O irmão andava de roupas rotas e chinelo de dedo, invejava-o, mas não admitia:
- é preciso adquirir coisas e cuidar delas. – não cansava de repetir para o irmão sempre que este vinha vê-lo.
O falcão nasceu para ser o senhor do céu, mas ensinaram-no desde cedo a gerenciar papéis e acumular coisas e ele nunca soube que seus olhos aguçados eram feitos para ver longe. No seu intimo mais profundo ele o sentia, mas não compreendia. Roubaram-lhe o seu destino. Ele nascera para os vôos mais profundos, para a mais alta das alturas, mas nunca soube e nunca saberia. Pois ainda que lhe cortassem as grades das janelas ele já se perdera em meio a todos os seus papéis e coisas acumuladas.
(rascunhado) por Adri.n
Do que está acontencendo e não se vê
Há chuva em meus olhos e uma tempestade varrendo meu peito. E minha alma olha para a janela a espera de que tudo passe. Mas a tempestade continua violenta, destruindo tudo. A alma agarra-se a alegria com toda sua força para que os ventos não a levem. Que ao menos esta permaneça para impedir o retorno da solidão...
O vento que outrora fora seu companheiro foi quem incitou a tempestade.
Ela deveria ter desconfiado. Os ventos sempre mudam de direção a qualquer instante por simples capricho e, mesmo calmo, ele era um vento.
O furacão ainda não veio, mas a alma sabe que o muro não o segurará para sempre. Resta-lhes (a minha alma e a alegria, ambas fracas) fecharem os olhos, respirarem fundo e resistirem. Tudo ficará em pedaços antes que a alma possa erguer-se
e quando tudo for apenas vazio e silêncio ela finalmente poderá juntar o que sobrar e concertar meu peito que enfim voltará a ser morada...
O vento que outrora fora seu companheiro foi quem incitou a tempestade.
Ela deveria ter desconfiado. Os ventos sempre mudam de direção a qualquer instante por simples capricho e, mesmo calmo, ele era um vento.
O furacão ainda não veio, mas a alma sabe que o muro não o segurará para sempre. Resta-lhes (a minha alma e a alegria, ambas fracas) fecharem os olhos, respirarem fundo e resistirem. Tudo ficará em pedaços antes que a alma possa erguer-se
e quando tudo for apenas vazio e silêncio ela finalmente poderá juntar o que sobrar e concertar meu peito que enfim voltará a ser morada...
quarta-feira, 19 de março de 2008
palavras não jogadas ao vento
Quando vejo uma folha em branco
Anseio por abrir meu peito
Com as unhas
Para soltar todas as palavras
Que estão apertadas e embaralhadas no meu coração
Já superlotadas e sufocadas de idéias trancafiadas
Que gritam por liberdade
Por estarem
Injustamente
Condenadas ao silêncio.
Adri.n
Anseio por abrir meu peito
Com as unhas
Para soltar todas as palavras
Que estão apertadas e embaralhadas no meu coração
Já superlotadas e sufocadas de idéias trancafiadas
Que gritam por liberdade
Por estarem
Injustamente
Condenadas ao silêncio.
Adri.n
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